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Bibliocausto

Que a minha mão não trema ao deitar no fogo forte e primitivo todos os traidores que me deram veneno. Queimarei o frio geometrizador da vida lapidada através de lentes bem polidas (ah, o horror daquela pedra voando, tangida pela mão de não sei que demônio, e a pensar, pelo espaço, que ainda tem arbítrio!…)… Queimarei o detrator, maníaco e vaidoso, que quis deter a vida numa câmara lenta, para a tingir depois numa câmara escura (ah, o inferno galopando às doidas nos cavalos sem freios da vontade cega e sem destino!…) Queimarei o louco, ébrio de orgulho, raivoso de fraqueza, que destilava haxixe em frascos verdes na paisagem alpina (ah, o prazer com que ainda o queimaria em cada uma das voltas pavorosas do seu Eterno Retorno!…)… E só ficará comigo o riso rubro das chamas, alumiando o preto das estantes vazias. Porque eu só preciso de pés livres de mãos dadas, e de olhos bem abertos… João Guimarães Rosa